segunda-feira, 1 de março de 2010

ABRIL

Logo estará sobre nós o céu de abril
Com sua abóbada de um pálido azul
Por onde passam galáxias que não vemos
E abaixo faz seu arco um sol amarelo,
Que lança longas sombras sobre a terra,
Tornando o que é pequeno, imenso.

Abril. Voltará o prazer de andar na rua,
Com, ao mesmo tempo, calor e frio
No claro-escuro alternado das calçadas,
Olhar os alegres fiapos de nuvens
Correrem velozes pelo céu, o vento
Levar as folhas, levantar saias e jornais.

A cidade ficará humanizada
E nela a vida mais fácil de levar-se;
Irá bem uma boa feijoada,
Ou um cozido, como de praxe, à portuguesa,
Se não um prato (fundo) de macarronada,
Uma branquinha, um belo copo de vinho.

Com abril vem a época adequada
Para ver-se uma boa peça e jantar depois da cena,
Sentar-se nos cafés, ir ao cinema, virar os sebos
Atrás do livro que sumiu e se quer reler,

Será a hora de aquecer-se, de aninhar-se,
Voltarão os cobertores para as camas,
Casacos e suéteres para os corpos. Engordar.
Os Cucas introduzirão as sopas nos cardápios,
Os chás, os bolos, o chocolate quente,
As tortas, pastéis e aguardentes.

Na França estaríamos em germinal
O nome revolucionário de abril,
Mas germinal lá é primavera, melhor
Seria aqui fructidor, o outono.
Quando estariam maduros
Os frutos de termidor

Abril são ruas cheias (é doce caminhar
Ao sol do outono), lojas, luzes, vitrines,
Brilharão nos bairros ricos da cidade,
Ficando a miséria em suas esquinas
E ela é tanta, que não basta só
A estação que entra, para escondê-la.

À noite chegarão como sempre vêm,
Os trapeiros virando o lixo dos burgueses,
Estranhos proletários das calçadas
À cata de garrafas e latinhas,
Com suas carroças que passam adernadas
Sob o peso das caixas de papel...